Todo dia é dia mãe: a maternidade de Tayane de Souza Barcelos
Mãe: aquela que dá à luz e/ou cria um filho. Definição pura e simples que o português apresenta. No coração dos filhos uma ressignificação: amor incondicional, porto seguro, carinho, razão e proteção. Para as mães: ter um coração batendo fora do corpo, no mundo.
É através da nossa mãe que temos o primeiro contato com a vida, pelo olhos dela é que vamos descobrindo os mistérios do “lado de fora”. Desde o primeiro respirar, é o colo que acalma, e do vocabulário, a primeira palavra dita.
A maternidade nos é tão familiar, desde tão cedo, que esquecemos a beleza da sua simples presença.
É por isso que o Blog do Clubinho de Ofertas está se dedicando a contar histórias de mães. Mãe jovem; mãe velha; mãe de um; de dois; de três; mãe moderna; mãe tradicional; mãe das diferenças; mãe dos desafios. Mulheres que aprenderam e aprendem a ser mãe todas as manhãs.
Porque acreditamos que todo dia é dia de mãe!
Abrimos a série #tododiaédiademãe com Tayane de Souza Barcelos, a mãe do Bento. Carioca, advogada, feminista e leoa, para ela, a maternidade é uma “aventura hiper-ultra-mega intensa”.
Tayane assegura que ser mãe é uma resistência diária. É preciso ter peito para olhar o mundo e encará-lo, mas, sobretudo, conseguir olhar para dentro de si e ser força viva que supera e avança. Aos 17 anos, perdeu o primeiro filho, e foi lá que (já) precisou descobrir tudo isso. Há quase três anos, a convivência com o filho revoluciona sua trajetória.
(Clubinho de Ofertas) Você já tinha pensando em ser mãe? Ele foi planejado?
Tayane de Souza Barcelos: Eu já tinha sofrido um aborto espontâneo aos 17 anos, antes de pensar em ser mãe. Fiquei devastada. Seria fruto de um relacionamento que hoje enxergo como abusivo, mas a época, me preenchia e era bem intenso. Abortei pouco depois de ter descoberto. Tinha acabado de contar ao meu namorado, que aparentemente iria me apoiar. Minha decisão tinha sido manter a gravidez. Eu ainda não havia contado aos meus pais. Mas já havia decidido que me tornaria mãe, acompanhada ou sozinha. Abortei no banheiro da minha tia depois de ter sido ameaçada pelo marido da minha mãe, mais uma vez. Ali, decidi que se engravidasse de novo não permitiria que ninguém interrompesse aquele momento. Desde então, todos os exames e ultras de rotina me diziam que seria difícil engravidar outra vez. Não fiz os procedimentos corretos à época, desenvolvi SOP (Síndrome do ovário policístico) e tinha chances remotas de gerar de novo. Assim que, quando descobri que estava grávida outra vez, só pude pensar em como seria dali por diante, porque eu iria adiante, ainda que não tivesse planejado. Eu já me sentia preparada. Tinham me tirado um pedaço antes e agora eu ia fazer diferente. Não porque precisava, mas porque queria.
(C.O) O que passou na sua cabeça quando você soube da gravidez do Bento, aos 24 anos?
T.S.B: A primeira coisa que consegui fazer foi sentar. As minhas pernas não me obedeciam. Acho que minha cabeça entendeu que o chão não estava mais ali, e realmente não estava. Eu só pensava em como iria criá-lo, já que ainda não tinha terminado a faculdade. Sempre fui muito independente de tudo e todos, e nessa hora não enxerguei todo apoio que teria. Lembro que eu não conseguia tirar a mão da minha barriga.
(C.O) O que mudou na sua vida depois da chegada do Bento?
T.S.B: A vida. (Rs).. Não consigo mensurar em palavras ainda, e nem sei se conseguirei um dia, toda a revolução que a maternidade representou e representa na minha caminhada. Mas, com certeza, afirmo para você que a mudança foi positiva. Dolorida, inquieta, intensa, diária, constante, mas positiva. A minha visão de mundo, desde que trouxe o Bento a ele, mudou no sentido de: é minha missão melhorar isso aqui. Eu fui uma das responsáveis pelo retorno espiritual dele e não posso simplesmente deixar as coisas acontecerem. Eu tenho que fazer as coisas acontecerem, e acontecerem melhor. É meu papel enquanto Mulher e agora Mãe fazer parte do mundo para que me enxerguem, me respeitem, me ouçam. Para que o meu filho aprenda a ser assim. Porque a atitude ensina muito. A palavra também, mas a atitude mostra mais. Com a vida do Bento a minha vida ganhou mais sentido. Agora, eu não só existo, como existo por ele. E isso é de uma responsabilidade revolucionária que transborda, todo dia.
Tayane aprendeu que organização é a chave da maternidade.Na infância, quando a vó exigia os horários, ela não gostava nada nada, mas o Bento lhe ensinou que com criança é preciso ser “a louca da rotina”.
Eu sempre achei um absurdo esse negócio de ter hora para isso ou aquilo, acredito que as pessoas devem ser livres para fazer o que quiserem no momento certo. Mas criança precisa de rotina e aprendi que tinha que ter hora para tudo, para que o Bento pudesse ter também.
(C.O) Qual foi o maior desafio desse processo?
T.S.B: O exercício diário de fechar os olhos para o mundo, para as pessoas e julgamentos e me conectar apenas com meu filho.
(C.O) Todo mundo tem uma ideia sobre a maternidade na cabeça, mas, provavelmente, você se surpreendeu com muitas coisas. Dessas descobertas, o que mais mexeu com você?
T.S.B: Realmente foram várias. Mas talvez a mais intensa foi descobrir o meu lado animal. É absurdamente estranho conceber que somos bicho também. Meu lado leoa surgiu impactante, surgiu esmagador. E vem se fortalecendo de uma forma que me orgulha. Descobri que sou uma leoa.
A Tayane mulher adora ler, e entre uma responsabilidade e outra ela tenta deixar a leitura em dia. Já a Tayane mãe tem um hobby bem delicinha:
O que a Tayane-mãe mais gosta de fazer é cheirar o cangote do Bento enquanto assistimos algo.
(C.O) Qual a sua rotina?
T.S.B: Eu acho que não consigo resumir muito, mas tentarei rs. Pela manhã amamento o Bento e preparo as coisas do dia dele (mochila com roupas e brinquedos), dou banho e as homeopatias, nos dias em que meu companheiro está em casa sento para tomar café. Nos dias em que não está, tomo café fazendo o restante das coisas. Deixo o Bento com meus sogros e vou para o escritório. Aproveito para ler sobre minhas causas e revoluções diárias (feminismo negro, maternidade, ancestralidade etc). Na volta para casa, no coletivo, leio mais um pouco. Estando em casa geralmente dou a janta de Bento, brincamos, lemos, amamento, dou mais um banho e o coloco para dormir. Às vezes, depois disso, faço alguma coisa na casa, mas geralmente pego no sono junto com ele.
(C.O) O feminismo mudou o papel da mulher de hoje em dia, como você acha que esse movimento influenciou na relação da mulher com a maternidade?
T.S.B: O feminismo é a mãe da minha maternidade (acho que ficou confuso! Rs). Os movimentos, relatos, experiências das minhas “irmãs” revolucionaram minha passagem de mulher para mulher mãe. Sem o feminismo eu seria uma ótima mãe, mas com ele eu sou uma ótima mãe que tem consciência de que a maternidade não é boa para todas as mulheres e que é meu dever ajudá-las como puder. E não só isso, com o feminismo eu sou mais forte para ser Mãe. O feminismo me mostrou que faço parte de uma coisa muito maior e que sou um fenômeno. E esse senso me fortalece muito na minha relação com meu filho, porque fortalece minha relação com o mundo. Sem sombra de dúvida, devo muito a todas as mulheres empoderadas que passaram por mim e me apresentaram o caminho. Eu só tenho a agradecer.
Da lembrança mais doce da infância, que era ver a mãe se arrumando para ir ao trabalho – “ela era tão linda”-, ao dia a dia como mãe do Bento. Tayane tem sua própria palavra, potente e real, para definir a experiência que vive hoje: “luta; com o peito cheio de amor e os olhos de lágrima”.